A OPINIÃO DO “MUNDO” – A NÃO PERDER
Durante sua vida, Leni Riefenstahl recusou-se a deixar Hollywood fazer uma cinebiografia dela. Vários tentaram antes de desistir: Jodie Foster, Steven Soderbergh, Paul Verhoeven. Muitos roteiristas terão quebrado os dentes ali. A empatia seria complicada; julgamento, desinteressante. E o que mostrar? A mulher livre, diretora pioneira, que se estabeleceu num mundo masculino? O cineasta favorecido por Hitler ajudou a moldar o super-homem e armou esteticamente o IIIe Reich? Ou a mulher arrependida que passou o período pós-guerra reescrevendo a sua história e mentindo, alegando ignorância sobre o que o regime de Hitler estava fazendo?
Levaria muito tempo para um cineasta genial superar um abismo de ambiguidade. Filmando uma mulher monstruosa E incrível. Este foi precisamente o título de um documentário essencial de Ray Müller, que se intitulava A maravilhosa e horrível vida de Leni Riefenstahl (1993), feito durante sua vida.
Trinta anos depois, teremos agora de contar com outro grande documentário, Leni Riefenstahl. Luz e sombras, por Andres Veiel, que pôde consultar as 700 caixas de arquivo zelosamente guardadas por seu companheiro, falecido em 2017. Arquivos pessoais, gravações de áudio, entrevistas televisivas, fotos são comparados com os próprios filmes do cineasta. Ela foi primeiro dançarina e atriz antes de passar a dirigir com Luz Azul (1932). Fascinado, Hitler ordena-lhe. Será O triunfo da vontade (1935), que consolidou o Fürher como líder carismático e salvador da nação. Monitorando Deuses do Estádiocaptura monumental dos Jogos Olímpicos de Berlim de 1936 onde se exalta a beleza do gesto desportivo e do corpo viril.
Estado de “emigração interna”
Colossal trabalho de arquivo e edição, o documentário de Andres Veiel é parcimonioso na narração e nunca nos diz o que pensar: discretamente, a montagem destaca contradições, inconsistências, mistificações. Dar um veredicto não é a sua principal preocupação, e esse é todo o seu preço. É agradável para o espectador esse sentimento que não escolhe entre o horrível e o fascinante, o monstro e o feminista. A partir daí, nos é dado espaço para refletir: sobre a beleza que pode cegar e servir de pretexto para a imoralidade; a este olhar de mulher que coloniza tudo o que olha, nomeadamente quando, na década de 1960, foi ao Sudão fotografar a tribo Nuba, e ousou colocar produtos para financiar a sua viagem.
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