TEMristote professa que todos os seres humanos desejam naturalmente saber. A nossa própria experiência ensina-nos que todos os seres humanos também querem não saber – e por vezes ferozmente. Isto sempre foi verdade, mas há períodos na história em que a negação de verdades óbvias parece assumir o controle, como se bacilos psicológicos estivessem se espalhando por meios desconhecidos, e o antídoto perdesse subitamente a sua eficácia. Vivemos hoje em tempos assim.
Na era dos demagogos, triunfa a paixão pela ignorância. Cada vez mais dos nossos contemporâneos consideram os argumentos racionais como um jogo tolo cujo único objectivo é ocultar as manipulações do poder. Outros acreditam ter acesso privilegiado à verdade que os isenta de qualquer questionamento. Multidões hipnotizadas seguem gurus malucos, rumores irracionais provocam atos fanáticos, o pensamento mágico suplanta o bom senso e o conhecimento. E, ainda por cima, vemos brilhantes profetas da ignorância, eruditos escarnecedores do conhecimento, idealizando “o povo” para encorajá-lo a resistir à dúvida e a erguer muralhas em torno de suas crenças ossificadas. Num mundo como este, aqueles de nós que estão comprometidos com a razão e o debate podem sentir-se um tanto apátridas.
É sempre possível encontrar causas históricas próximas para estes surtos de febre irracional. Mas estas explicações por vezes impedem-nos de reconhecer que a fonte deste mal é mais profunda, que está dentro de nós e atravessa este mundo indiferente aos nossos desejos.
O mundo é um lugar recalcitrante, com certeza, e há coisas que preferiríamos não reconhecer. Algumas são verdades desconfortáveis sobre nós mesmos – estas são as mais difíceis de aceitar. Outras são verdades sobre a realidade externa que, uma vez reveladas a nós, privam-nos de crenças e sentimentos que, de uma forma ou de outra, tornaram as nossas vidas melhores, mais fáceis de viver – ou assim pensamos. O desencanto produzido pelo conhecimento é uma experiência tão dolorosa quanto comum, e não é de surpreender que este verso de um poema inglês [de Thomas Gray (1716-1771)] tornou-se um ditado bem conhecido: “Ignorância é uma bênção”.
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