Sérgio Hercberg: O Nutri-Score é baseado em dois algoritmos distintos: um para bebidas e outro para os chamados alimentos gerais. A partir de agora, as bebidas lácteas serão pontuadas com o algoritmo de bebidas, assim como refrigerantes e sucos de frutas. No entanto, isto é mais rigoroso para o teor de açúcar. Alguns iogurtes para beber contêm entre 10 e 13 g de açúcar por 100 ml, tanto quanto os refrigerantes. Além disso, eles agora recebem uma pontuação D ou E.
Por que tanta diferença entre os algoritmos, que significa que um mesmo produto pode ser classificado como B ou D dependendo se é sólido ou líquido?
Sérgio Hercberg: O tempo necessário para esvaziar o estômago é menor para alimentos líquidos do que para alimentos sólidos. Porém, o esvaziamento gástrico mais rápido retarda a sensação de saciedade. Além disso, alimentos líquidos, como beber iogurtes, costumam ser consumidos como lanches, ao contrário dos iogurtes clássicos, que geralmente são ingeridos no final da refeição, quando a sensação de saciedade é desencadeada mais rapidamente.
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“O algoritmo para alimentos ‘gerais’ ficou mais difícil”
A nova fórmula também impactou na classificação dos alimentos ultraprocessados?
Sérgio Hercberg: Sim, porque o algoritmo para alimentos “gerais” também se endureceu. 87% dos alimentos ultraprocessados vendidos em França serão agora classificados como C, D ou E, devido à sua composição ser demasiado rica em gorduras saturadas, açúcar, sal, ou à sua ingestão calórica ser demasiado elevada. Por exemplo, certos cereais como o Nestlé Chocapic obtiveram um Nutri-Score A com o antigo algoritmo e agora serão classificados como C.
No entanto, cerca de 13% dos alimentos ultraprocessados escapam a uma classificação baixa, nomeadamente os substitutos da carne – como os bifes à base de plantas – que, apesar do seu grau de processamento, apresentam uma composição nutricional relativamente favorável.
O Nutri-Score tem como objetivo sinalizar alimentos ultraprocessados?
Sérgio Hercberg: Sim, mas falta definir os critérios que permitem a classificação dos alimentos como ultraprocessados, tarefa que poderia ser confiada à ANSES (Agência Nacional de Segurança Alimentar). Como o ultraprocessamento (presença de aditivos, corantes, etc.) leva em consideração outras características além da composição nutricional de um alimento (lipídios, carboidratos, etc.), ele não pode ser integrado ao algoritmo Nutri-Score.
A solução seria adicionar uma borda preta ao redor do logotipo para indicar esses produtos. A decisão final cabe aos sete países europeus (França, Alemanha, Bélgica, Espanha, Países Baixos, Luxemburgo e Suíça) que adotaram o Nutri-Score. A comissão científica, responsável pelos algoritmos, tem apenas um objetivo: garantir que estes se baseiam em conhecimento científico rigoroso.
Com este novo Nutri-Score, não será ainda menos provável que seja adoptado por gigantes da indústria alimentar como Ferrero, Lactalis, Coca-Cola, Mars, Mondelez ou Kraft?
Sérgio Hercberg: Na verdade, mas em qualquer caso, estas empresas opuseram-se ao Nutri-Score desde o início. Especializam-se na produção de alimentos cujo consumo regular em grandes quantidades é prejudicial à saúde.
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No entanto, a Diet Coke foi classificada como Nutri-Score B, o que poderia ter sido um argumento de venda.
Sérgio Hercberg: Até agora, certas bebidas adoçadas podiam obter um Nutri-Score B. No entanto, desde a primeira versão do algoritmo, vários estudos, incluindo uma síntese da Agência Internacional de Investigação sobre o Cancro (Circ), estabeleceram uma ligação entre o consumo de adoçantes e um risco aumentado de diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, bem como excesso de mortalidade a longo prazo. A comissão decidiu, portanto, acrescentar pontos negativos adicionais às bebidas que contêm estes aditivos. Eles serão pelo menos classificados como C.
“Este logotipo nutricional não proíbe o consumo de alimentos ou bebidas classificados como D ou E”
Correndo o risco de a rotulagem se tornar ainda mais rara…
Sérgio Hercberg: Lamento, porque este logótipo nutricional não proíbe o consumo de alimentos ou bebidas com classificação D ou E. Indica simplesmente que devem ser consumidos com moderação. Por outro lado, aconselho-o a perguntar-se: deve comprar um produto cujo fabricante se recusa a ser transparente quanto à sua composição?
Em qualquer caso, os parâmetros dos algoritmos são públicos, aplicações como o Open Food Facts geram o Nutri-Score a partir da informação nutricional obrigatória presente na embalagem. Basta escanear o código de barras para saber a pontuação.
No contexto atual, que futuro para o Nutri-Score?
Sérgio Hercberg: Continuo otimista. Nestlé, Vico, Carrefour, Lidl e Leclerc optaram por manter a transparência com os consumidores. Mais de 1400 marcas exibem isso! Além disso, um estudo de abril de 2024 demonstra que o Nutri-Score incentiva os fabricantes a reformularem os seus produtos. A transparência alimentar responde à crescente procura dos consumidores. Segundo a Santé Publique France, este indicador é favorecido por mais de 90% dos consumidores que pretendem que se torne obrigatório.
Também se beneficia da dinâmica que leva os Estados a implementarem logotipos como na Austrália, Nova Zelândia, Singapura, Xangai e em quase todos os países da América Latina.