“Estou no céu”: aos 53 anos, Towana Looney, uma americana cujo único rim já não funcionava, tornou-se a terceira pessoa viva no mundo a beneficiar de um transplante de rim de porco, uma prática ainda muito experimental.
A paciente, ainda sob supervisão médica desde a operação no final de novembro no NYU Langone Hospital, em Nova York, pioneira na área, voltou na terça-feira à sua jornada médica sem precedentes.
“Tive a sorte de ter recebido este presente, uma segunda chance na vida”, confidenciou ela ao lado da equipe médica durante entrevista coletiva.
Looney doou um de seus rins para sua mãe em 1999 e viveu oito anos em diálise depois que uma complicação na gravidez danificou seu rim restante.
Este americano do Alabama, no sul dos Estados Unidos, esperava por um transplante desde 2017 e não conseguiu encontrar um doador compatível.
À medida que sua condição médica piorava, ela foi autorizada a receber um rim de porco geneticamente modificado.
“Estou cheia de energia, tenho apetite”, garantiu ela na terça-feira, continuando com uma risada: “e claro que posso ir ao banheiro!”
Este tipo de transplante denominado xenoenxerto, entre animal e humano, alimenta a esperança de responder à escassez crónica de doações de órgãos num país onde mais de 100 mil pacientes estão em lista de espera, incluindo mais de 90 mil por um rim.
– Compatibilidade biológica –
Três semanas após a operação, o paciente apresenta “condições renais normais”, disse o cirurgião Robert Montgomery, membro da equipe médica.
Um hospital em Boston e a NYU Langone em Nova York já transplantaram rins de porco em dois outros pacientes vivos, Rick Slayman e Lisa Pisano, no início deste ano. Mas este último, gravemente doente, morreu poucas semanas depois.
Towana Looney, cujo estado geral de saúde é melhor do que o dos pacientes anteriores, beneficiou de um rim com dez modificações genéticas, em comparação com apenas uma do órgão transplantado anteriormente pela equipa de Nova Iorque.
Estas modificações no DNA do porco têm como objetivo melhorar a compatibilidade biológica entre o animal e o homem e evitar que o órgão seja imediatamente rejeitado pelo organismo do receptor.
Uma nova combinação de medicamentos também foi testada neste último transplante.
A equipa médica anunciou terça-feira que a empresa Revivicor, fornecedora do rim transplantado, vai pedir às autoridades norte-americanas autorização para iniciar, a partir do próximo ano, ensaios clínicos nos dois tipos de rins desenvolvidos.
“Este é um divisor de águas para o futuro dos transplantes”, disse Kevin Longino, da National Kidney Foundation (NKF), uma associação dedicada às doenças renais, em comunicado na terça-feira.
De acordo com um inquérito aos seus membros, os pacientes desejam, apesar dos riscos associados, um acesso rápido aos ensaios clínicos devido, em particular, aos “efeitos incapacitantes da diálise: exaustão, isolamento e incapacidade de levar uma vida normal”.
“Todos os dias, uma média de catorze americanos morrem enquanto esperam por um transplante de órgão que salve vidas, sublinhando a necessidade de explorar soluções alternativas”, insiste a fundação.
– Progresso –
Há muito confinado à ficção científica, o xenotransplante beneficiou recentemente dos progressos realizados na edição genética e no controlo da resposta do sistema imunitário, limitando os riscos de rejeição.
“O próximo objetivo é prolongar a vida útil desses rins, incluindo doá-los a pessoas mais saudáveis, que tenham mais chances de viver mais”, disse Montgomery.
Vários outros transplantes desse tipo foram realizados por sua equipe nos últimos anos, incluindo o primeiro transplante mundial de rim de porco em paciente com morte cerebral, em setembro de 2021. O órgão funcionou bem por alguns dias.
Outra equipe científica americana realizou em 2022 o primeiro transplante mundial de coração suíno em um ser humano vivo. Mas o homem, operado por cirurgiões da Universidade de Maryland, morreu dois meses após a operação.
Os cientistas estão otimistas porque os órgãos transplantados não foram imediatamente rejeitados pelos corpos dos pacientes.
“Aprendemos muito com cada transplante. Agora sabemos muito sobre o que o rim de porco pode fazer”, garantiu o cirurgião Robert Montgomery.
Towana Looney deverá poder voltar para casa em três meses, disse a equipe médica.